Há anos, o capital internacional tem se interessado por um dos nossos maiores recursos naturais: a água. Segundo dados da Unesco, por ano, o Brasil envia para o exterior aproximadamente 112 trilhões de litros de água doce, o que equivale a cerca de 45 milhões de piscinas olímpicas.
O capital, sobretudo internacional, há anos tem se interessado por um dos maiores recursos naturais que despomos em nosso território: a água. Do ponto de vista estratégico, esse é um dos elementos fundamentais que garantem nossa soberania, no entanto, a cada ano que passa, observamos a ganância das multinacionais, se apropriando deste bem natural tão importante pra vida.
Segundo dados da Unesco,
por ano, o Brasil envia para o exterior aproximadamente 112 trilhões de
litros de água doce, o que equivale a cerca de 45 milhões de piscinas
olímpicas. Esse número nos coloca entre os maiores exportadores da
chamada “água virtual“, um conceito que mede a quantidade de
água utilizada e absorvida na produção de commodities agrícolas voltadas
para a exportação.
No Brasil, a quantidade de água voltada somente
para a agricultura beira os 70% do consumo total, valor bem mais alto
que os 20% correspondentes à indústria e os 10% voltado para o consumo
doméstico.
Entre os produtos exportados que mais utilizam água, a soja se destaca. Recentemente, o IPEA lançou um relatório sobre a “água virtual”
utilizada na produção do grão. De acordo com o órgão, só em 2013,
exportamos mais de 55,6 milhões de toneladas de soja, totalizando, um
volume de água superior a 123 bilhões de m³.
Os principais destinos foram China (71 bilhões de
m3), Países Baixos (12,8 bilhões de m3), Espanha (4,8 bilhões de m3),
França (3,7 bilhões de m3), e Alemanha (3,4 bilhões de m3).
Consumo desproporcional
São diversas as formas de obtenção de água por
parte das grandes empresas multinacionais que dominam o mercado do
agronegócio irrigado no país.
Segundo o IBGE, no início dos anos 1960, o Brasil
tinha apenas 462 mil hectares irrigados. Hoje em dia, o número é bem
mais elevado, a estimativa é que mais de 6,1 milhões de hectares estejam
voltados para o consumo de água para o agronegócio e com possibilidade
de expansão para até 47 milhões de hectares.
Recentemente, a população de Correntina, município
localizado no oeste da Bahia se revoltou ao observar a forma
desproporcional a qual uma empresa vinha utilizando a água de um dos
rios que cortam a região. A empresa em questão, Igarashi, de origem
japonesa, consome hoje aproximadamente 100 vezes mais do que toda
população do município, retirando água diretamente do Rio Arrojado,
responsável por abastecer a cidade.
O ato trouxe a tona uma antiga discussão da forma
com que as empresas vêm se apropriando dos rios e em alguns casos, até
mesmo de nascentes.
Uma tecnologia recente vem dominando as produções irrigadas do agronegócio em todo o país, os chamados “pivôs centrais“.
Esse sistema envolve uma área circular projetada para receber uma
estrutura suspensa que em seu centro recebe uma tubulação que gira de
forma circular. Esse processo envolve uma grande quantidade de água que
na maioria dos casos é proveniente de rios, por meio de bombas.
O mapeamento nacional dos pivôs centrais indicou
19,9 mil equipamentos, em 2014, com ocupação de 1,3 milhão de hectares.
Essa área é 43% superior à registrada pelo IBGE no Censo Agropecuário de
2006, quando os números indicavam 893 mil hectares.
Os sistemas estão localizados em sua maioria em
áreas de cerrado e mata atlântica, respectivamente 79% e 11%,
majoritariamente nos estados de Minas Gerais, Goiás, Bahia, Paraná e São
Paulo.
Segundo Temóteo Gomes, da coordenação do Movimento
dos Atingidos Por Barragens (MAB), na região oeste da Bahia, importante
pólo de produção do agronegócio nacional, centenas de pivôs foram
instalados nos últimos anos, consumindo um número absurdo de água.
“Só na região de Jaborandi, temos instalados
mais de 117 pivôs centrais. Em todo o Oeste da Bahia são mais de 160 mil
hectares irrigados, tem empreendimentos com 12 bombas de captação de
água ligadas 24h. A maioria é monocultura, grãos para exportação, nada
fica pra região“, afirma Temóteo.
A “outra” ameaça do agronegócio
Além da água absorvida diretamente e entregue aos
estrangeiros, o agronegócio, ao explorar a terra por meio de
monoculturas, gera impactos diretos e indiretos aos ecossistemas. A
forma de produção limitada a um só “produto” pode desencadear
uma alteração brusca no meio ambiente, alterando o nível de chuvas, por
exemplo, o que acaba diminuindo o abastecimento dos rios e nascentes,
além de causar impactos sociais às populações. É o que aponta Bruno
Pilon, da coordenação nacional do MPA (Movimento dos Pequenos
Agricultores).
“O maior problema é que a conta do uso da água,
e o retorno da água pelo agronegócio não fecham. Além dos índices de
contaminação eles retiram mais água do que conseguem colocar no solo,
onde o agronegócio passa fica um rastro evidente de seca. Conseguimos
observar isso de forma muito marcante nos monocultivos do eucalipto no
extremo norte do ES e no sul da BA responsável por secar muitos
mananciais que atendiam comunidades camponesas inteiras, o eucalipto é
exportando, vai pra longe, mas a seca fica“, aponta.
Segundo ele, outro impacto profundo causado pelo
agronegócio diz respeito à contaminação das nascentes pela produção
intensiva com agrotóxicos.
“A legislação ambiental que diz respeito ao uso
dos venenos não é cumprida por eles, e mesmo se fosse sabemos que ainda
iria impactar. Quem tem um cofre no peito, não tem respeito algum às
fontes de água, e isso tudo vai parar no prato, ou no copo das pessoas,
os componentes dos venenos não desaparecem na água, e impactam toda a
vida ao seu redor, não só as famílias camponesas, mas o bioma por
completo. O agronegócio vê a água assim como o solo, como um depósito de
fatores, lá se tire e se coloca o que quer e quando quer e quem mais
sofre com isso são as populações do campo e da cidade, da pra imaginar
que quando você toma banho em sua casa pode estar também se “ensaboando”
com glifosato?”, questiona.
Para Bruno, vivemos num momento delicado no que diz respeito ao consumo de água, correndo riscos graves de escassez.
“Um dos impactos indiretos mais cruéis são os
relacionados à morte de muitos rios e córregos, eles mudam drasticamente
o mapa hidrográfico de onde se instalam e isso muitas vezes é
irreversível, sendo responsável pelo fim do abastecimento de água de
muitas comunidades. Esse modelo de produção não só está fardado ao
fracasso, como empurra toda a humanidade com ele, a desertificação de
nossos solos está em curso acelerado, e podemos chegar a um quadro
irreversível, é muito contraditório viver num pais com uma das maiores
reservas de água do mundo, se o modelo produtivo nos cerceia o acesso“, completa.
Fonte: https://www.pragmatismopolitico.com.br/2018/03/agronegocio-exporta-agua-doce-brasil.html?utm_source=feedburner&utm_medium=email&utm_campaign=Feed%3A+PragmatismoPolitico+%28Pragmatismo+Pol%C3%ADtico%29
Acesso: 19 mar. 2018.