Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara e aliado de Temer, durante a discussão das MPs: votação simbólica escondeu voto dos deputados |
Aprovadas, as MPs 756 e 758 ampliam a
exploração na Amazônia. Entenda
Base do governo Temer aprova medidas que reduzem a proteção no Pará e
abrem espaço para a regularização de invasões e grilagem de terras públicas
Entre a noite de
terça-feira 16 e a madrugada desta quarta-feira 17, o plenário da Câmara dos
Deputados aprovou duas Medidas Provisórias – a 756 e a 758 – que ampliam as
possibilidades de exploração em áreas importantes da Amazônia, especificamente no
estado do Pará. As medidas são duramente criticadas por organizações não
governamentais e até pelo Ministério do Meio Ambiente, mas defendidas
firmemente por políticos locais e também por deputados.
Os textos, editados em dezembro pelo presidente Michel Temer,
foram aprovados em votação simbólica, na qual os deputados não precisam se
identificar individualmente. Durante todo o debate, que levou mais de oito
horas, ficou claro que a base governista, liderada por PMDB e PSDB, estava
determinada a aprovar as medidas. Votaram contra as MPs os partidos do campo progressista, como PT,
PSOL, PCdoB e Rede.
No centro da
discussão estão três categorias de unidades de conservação existentes no Brasil
– a Floresta Nacional (Flona), que tem as regras mais rígidas de proteção
ambiental; o Parque Nacional (Parna), também com regras firmes; e a Área de
Proteção Ambiental (APA), que em geral permite a venda de terras, o
desmatamento do tipo "corte-raso" e a realização de atividades
econômicas como mineração e agropecuária. Muitas áreas se tornaram APAs,
ampliando o risco de devastação.
Entenda, abaixo, a disputa sobre as MPs 756 e 758.
O que diziam as MPs editadas por Temer?
A MP 756 alterava os limites da Floresta Nacional do Jamanxim
(localizada em Novo Progresso, no Pará) e do Parque Nacional do Rio Novo
(nos municípios de Itaituba, Jacareacanga e Novo Progresso), ambos criados
em 2006, no governo Luiz Inácio Lula da Silva, e criava a Área de
Proteção Ambiental do Jamanxim. A
Flona seria reduzida de 1.301.120 hectares para 557.580 hectares. O Parna seria
ampliado de 537.757 hectares para 976.525 hectares. A APA seria criada
com 542.309 hectares.
A MP 758, por sua vez,
reduzia a Área de Proteção do Tapajós (localizada nos municípios de Itaituba,
Jacareacanga e Trairão) de 2.039.580 hectares para 1.988.445
hectares, entregando essas terras para o Parque Nacional do Jamanxim, que
seria ampliado em 51.135 hectares
Uma outra área do Parna Jamanxin (862 hectares), entretanto,
deixaria de ser protegidos para dar lugar às obras da Estrada de Ferro 170
(conhecida como Ferrogrão) e à BR-163, a rodovia Cuiabá-Santarém. As duas vias
são importantes para o escoamento da produção agropecuária do Centro-Oeste.
O que alegava o governo
Temer?
O governo Temer
afirmava que a intenção das MPs era acabar com um conflito com a sociedade
local que se alastra durante anos, pois alguns produtores rurais locais nunca
aceitaram a criação da Flona, e regularizar as posses de pequenos
produtores rurais.
Qual foi a reação às MPs?
Diversas entidades e pesquisadores criticaram as medidas
provisórias. A principal crítica girava em torno da redução do status de
proteção de uma grande área da Flona do Jamanxim em meio à maior alta do desmatamento na Amazônia desde
2009. Além disso, o Instituto Socioambiental (ISA), por exemplo, lembrou que
seriam beneficiados pela redução da Flona apenas 257 donos de terra, que têm
propriedade de 1,7 mil hectares, "18 vezes o tamanho médio da propriedade
normalmente atribuída à agricultura familiar". Seriam, portanto,
latifundiários.
A bancada ruralista da Câmara e políticos locais também achavam
que as MPs de Temer eram muito ruins, mas por outro aspecto: protegiam demais o
meio ambiente. "Novo Progresso já tinha 74% de seu território em unidades protegidas
antes da criação da MP, que amplia para 80,5%, e afeta diretamente a economia.
A insegurança que dão para a propriedade rural naquela região é muito
grande", afirmou o vice-prefeito do município, Gelson Dill, em
audiência pública realizada em março na Comissão Mista do Congresso para
debater o tema.
Quais alterações foram
feitas pelo Congresso nas MPs?
Na Câmara, dominada pelo setor
ruralista, fortalecido com o impeachment de Dilma Rousseff e a posse de
Michel Temer, as MPs foram desconfiguradas.
A MP 756 se tornou o projeto de conversão 4/2017, relatado pelo
deputado José Priante (PMDB-PA). O texto cancelou a ampliação do Parque
Nacional do Rio Novo e reduziu a Flona do Jamanxim ainda mais que o previsto
originalmente: 486 mil hectares dela, em vez de 305 mil hectares, serão
transformados na APA Jamanxim.
O texto incluiu também um "jabuti", como são chamadas as
emendas sem relação com o texto original. A emenda reduziu em 10 mil hectares o
Parque Nacional São Joaquim, em Santa Catarina, e alterou seu nome
para Parque Nacional da Serra Catarinense.
A MP 758 se tornou o projeto de conversão 5/2017, relatado pelo
deputado José Reinaldo (PSB-MA). O texto cancela a ampliação de 51 mil hectares
do Parque Nacional do Jamanxim e promove em seu lugar uma redução da área
original do parque, que deixa de 859 mil hectares para ter 515 mil
hectares.
Dos 345 mil hectares retirados, 71 mil terão um status de proteção
maior, sendo incorporados à Flona do Trairão, mas 265 mil hectares ficarão mais
desprotegidos – se tornarão duas APAs, da do Rio Branco e a do Carapuça
Uma outra unidade de conservação também foi reduzida no texto. A
Flona Itaituba II perdeu 169 mil hectares, que serão transformados na APA do
Trairão.
O que dizem os ruralistas
a respeito da aprovação das MPs?
José Priante (PMDB-PA), relator da MP 756, afirmou que o projeto
"tem o condão de arbitrar um conflito que existe na região há muitos anos".
Segundo ele, agora será possível promover a coexistência de áreas de
preservação com a exploração econômica na região. "Fazer uma lei para
que não seja respeitada e faça com que o erário tenha que gastar com operações
do Ibama e da Polícia Federal é fazer uma lei inócua", disse ao portal G1.
E o que dizem os
ambientalistas?
De acordo com uma nota técnica divulgada pelo Instituto
Socioambiental, a aprovação das MPs desprotege 1.19 milhão de hectares de
unidades de conservação. Enquanto as florestas e os parques nacionais são áreas
públicas protegidas, que permitem apenas atividades como turismo (Parna) e
exploração seletiva de madeira (Flona), as APAs podem ser privatizadas,
vendidas, desmatadas e ainda abrigar atividades econômicas como a mineração e a
agropecuária.A
vulnerabilidade das APAs fica explícita em levantamento recente da ONG Imazon.
Segundo a entidade, das dez unidades de conservação mais desmatadas na
Amazônia Legal entre 2012 e 2015, cinco são APAs.
Flona do Jamanxim, o alvo principal das MPs |
Além de ampliar o
desmatamento, as MPs podem regularizar grileiros de terra?
Terras localizadas nas APAs podem ser regularizadas e
vendidas. Assim, terras públicas que foram invadidas e griladas podem acabar
legalizadas. De acordo com o ISA, as áreas alvo das MPs vêm sendo
desmatadas em larga escala e ocupadas ilegalmente principalmente nos últimos
dez anos, depois que as unidades de conservação foram criadas. O município de
Novo Progresso, onde estão duas das unidades, é o líder no desmatamento nacional de acordo com dados do Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Ainda segundo o ISA, nessas áreas que terão sua redução protegida
foram registrados diversos Cadastros Ambientais Rurais (CARs) com milhares
de hectares. O CAR é um documento instituído em 2012 que pretende ajudar
regularizar propriedades rurais em áreas desmatadas. Apenas na Flona do Jamanxim
um CAR com quase 90 mil hectares foi registrado. "A mensagem é
que o crime compensa e isso vai incentivar o desmatamento e a invasão de terras
na Amazônia", afirmou Ciro Campos, do ISA, ao jornal Folha
de S.Paulo.
E para onde seguem essas
MPs agora?
As duas MPs
serão enviadas ao Senado, que também precisa aprová-las. Se passarem, seguem
para a sanção de Michel Temer.
O que governo e Ministério
do Meio Ambiente dizem sobre as MPs?
O Palácio do Planalto não se manifestou sobre as mudanças feitas
nas MPs. Em 12 de abril, o Ministério do Meio Ambiente, atualmente comandado
por Sarney Filho (PV-MA), emitiu nota com duras críticas às alterações
feitas na MP 756, afirmando que elas sinalizam
"contrariamente aos esforços do governo federal em conter o desmatamento
na Amazônia" e representam "um retrocesso nos esforços do governo
brasileiro para cumprir com os compromissos que assumiu sob o Acordo de Paris para combater o aquecimento global".
Fonte: https://www.cartacapital.com.br/politica/mps-756-e-758-ampliam-exploracao-na-amazonia-entenda
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