ESPERANÇA
O IMPULSO PARA MELHORAR
Artigo em
falta hoje em dia, a esperança – a atitude positiva diante de um momento
difícil – é um recurso fundamental para atravessar os obstáculos e construir um
futuro mais favorável.
Está
complicado. Por aqui, penamos em meio à pior crise econômica da história, que
deixou mais de 26 milhões de brasileiros desempregados. Associadas a ela estão
uma monstruosa cultura de corrupção e uma casta dominante que, no geral, não
tem pudores de sacrificar aqueles que representam para manter seus privilégios.
Enquanto isso, a violência não dá trégua, de norte a sul do país. Sente-se
sufocado e quer mudar de ares? Pois a situação aí fora também não anima muito.
Veja-se a vizinha Venezuela: para as dezenas de milhares de seus habitantes que
chegaram à Colômbia e ao Brasil nos últimos meses, os problemas desses países
são preferíveis aos que eles enfrentavam na sua pátria.
Mais ao norte, o
presidente da maior potência mundial vai confirmando algumas das piores
expectativas que havia sobre seu governo. Do outro lado do Atlântico, a onda de
imigração abala a União Europeia, que ainda lida com o Brexit e a letárgica
economia. A Coreia do Norte ameaça iniciar uma guerra nuclear com os Estados
Unidos, no gesto mais inusitado das ditaduras escancaradas ou disfarçadas que
têm prosperado no mundo. O Estado Islâmico e outros grupos cometem atos
terroristas aqui e ali. Nem falamos ainda do aquecimento global, e o rol de
notícias preocupantes está longe de acabar.
Diante de
um quadro desses, muitos desanimam. Outros, porém, seguem – intuitivamente ou
não – a máxima chinesa de que “crise é oportunidade” e vão em frente,
abrindo-se a novas possibilidades. A impulsioná-los está uma atitude mental
presente desde os primeiros tempos da humanidade: a esperança. Ela está por
trás das inúmeras voltas por cima que pessoas, comunidades e países vêm dando
ao longo da história.
Tempos de incerteza
A
esperança pode ser definida como a expectativa positiva, otimista, em relação a
determinado momento ou evento difícil por que estamos passando. “[Ela] não é
sua forma típica de positividade”, observa Barbara Fredrickson, professora de
psicologia da Universidade da Carolina do Norte (EUA). “A maioria das emoções
positivas surge quando nos sentimos seguros e saciados. A esperança é a
exceção. Ele entra em jogo quando nossas circunstâncias são terríveis – as
coisas não estão indo bem ou, pelo menos, há uma incerteza considerável sobre
como elas vão acabar.” Essa atitude, diz Barbara, aflora exatamente nos
momentos em que o medo, a desesperança ou o desespero parecem tão prováveis.
“Talvez você tenha acabado de perder seu emprego, seus sonhos para iniciar um
novo negócio ou se aposentar. A esperança, em tempos como estes, é o que o
psicólogo Richard Lazarus descreve como ‘temer o pior, mas desejar o melhor’”,
afirma.
A força das
“circunstâncias terríveis” citadas por Barbara não pode ser desprezada. No
artigo “The Neural Basis of Optimism and Pessimism” (“A Base Neural do Otimismo
e do Pessimismo”), publicado em setembro de 2013 na revista Experimental
Neurobiology, o neurocientista britânico David Hecht escreve que “nosso
bem-estar e sobrevivência requerem um equilíbrio entre otimismo e pessimismo”,
cuja desestabilização não chega a ser difícil. Hecht lembra que, segundo as
pesquisas, o otimismo está basicamente associado ao hemisfério cerebral
esquerdo, enquanto seu oposto “mora” no hemisfério direito. “A atenção aos
aspectos positivos de uma determinada situação, a elevada autoestima e a crença
de que o futuro será brilhante são todos mediados pelo hemisfério esquerdo”,
afirma.
Por seu
lado, o hemisfério direito “geralmente está envolvido na mediação de um foco no
lado negativo, em baixa autoestima e numa visão sombria sobre o futuro.” O equilíbrio
exato entre os dois lados não é desejável, diz Hecht. “Uma dose moderada de
otimismo, embora distorça a percepção de realidade da pessoa em certa medida,
pode ser vantajosa”, afirma. “Estudos que investigaram a correlação entre o
otimismo e a saúde sugerem que os otimistas geralmente têm melhor saúde física,
menos doenças cardiovasculares e melhor sistema imunológico.”
Negativismo
Já o
hemisfério direito, lembra Hecht, está modelado para detectar perigos e
preparar o corpo para lidar com ameaças. Embora necessária à sobrevivência,
essa disposição é acompanhada por medo, ansiedade e estresse, emoções que
submetem a percepção da realidade a lentes negativas. “Além disso, a mediação
do hemisfério direito de um modo ‘medroso’ dá suporte a uma relativa passividade
– estratégias de inibição, fuga e precaução – quando se lida com obstáculos ao
longo do caminho. Essas funções biológicas primárias do hemisfério direito
moldam sua forma de perceber o mundo, e assim o hemisfério direito ‘vê’ mais
problemas em potencial do que oportunidades em potencial.” O processo aciona
redes neurais que dão suporte e facilitam o desencadear de sentimentos de medo,
estresse, padrões de pensamentos negativos e conjuntos de ações posteriores.
Sem o controle dessa
característica do hemisfério direito, o efeito é perverso. “O medo nos
encerra”, diz Barbara Fredrickson. “Nossas ações se tornam rígidas e
previsíveis. O pessimismo impregna nosso monólogo interior e conduz nossas
decisões. Nossas perspectivas sombrias vazam em nossas trocas com familiares,
amigos e colegas, erodindo qualquer senso coletivo de segurança ou confiança. A
negatividade do medo também se infiltra em nossos corpos e afeta nossa saúde.”
Em vários lugares do mundo, os últimos tempos têm sido pródigos em fornecer
estímulos para o lado direito do cérebro. A globalização, por exemplo, é
frequentemente ligada ao desânimo de membros da classe média em países
desenvolvidos.
Com a
transferência de muitos empregos e fábricas para países em desenvolvimento,
essas pessoas perderam a perspectiva de progresso na vida. Outro aspecto,
ligado ao primeiro, é o intenso fluxo de imigrantes de países em
desenvolvimento (estes na esperança de melhorar de vida) rumo às economias mais
prósperas – algo que, para os que se sentem prejudicados, significa reduzir
ainda mais o número de empregos disponíveis (em geral, porém, os imigrantes
aceitam trabalhar em ocupações que os nativos rejeitam). Tais ingredientes
podem levar à desesperança e a consequências como o surgimento de governos populistas,
no estilo de Donald Trump nos EUA, e o isolacionismo caracterizado no Brexit, o
divórcio entre o Reino Unido e a União Europeia.
Rotas para o sucesso
Eventos
como esses mostram que a esperança pode ser sufocada ou perdida. Esse, aliás, é
um dos motivos pelos quais ela tem despertado o interesse acadêmico nas últimas
décadas. A primeira área a abrir os olhos para o tema foi a psicologia, nos
anos 1990, com o americano C. S. Snyder, autor do livro The Psychology of Hope
(“A Psicologia da Esperança”). Ele criou uma “Escala da Esperança” e, avaliando
seus resultados após mais de uma década de aplicação, chegou a conclusões
importantes. Segundo ele, pessoas com “baixa esperança” têm objetivos ambíguos
e trabalham para atingi-los um de cada vez. Já os indivíduos com “alta
esperança” frequentemente investem em cinco ou seis metas distintas ao mesmo
tempo, traçam rotas para o sucesso e caminhos alternativos caso deparem com
obstáculos – uma providência que os indivíduos com baixa esperança não tomam.
Outro estudioso
destacado da área é Anthony Scioli, professor de psicologia do Keene State
College (EUA) e autor dos livros Hope in the Age of Anxiety (“A Esperança na
Era da Ansiedade”) e The Power of Hope (“O Poder da Esperança”). Para ele, a
esperança é uma habilidade necessária que pode ser adquirida e tem múltiplas
facetas a serem cultivadas. Como os esperançosos revelam-se propensos a ser
mais resilientes, confiantes, abertos e motivados do que as outras pessoas,
tendem a receber mais do mundo, num processo de retroalimentação contínua.
A
espiritualidade, independentemente de religião, também é importante, frisa
Scioli. “A fé é o bloco de construção da esperança”, afirma. O vínculo
cooperativo que se estabelece inclui tanto o próximo como uma entidade
superior. As ciências sociais também descobriram o tema nas últimas décadas.
Para Hirokazu Miyazaki, professor de antropologia na Universidade Cornell
(EUA), esse assunto despontou a partir de dois eventos – o colapso da União
Soviética, que derrubou a esperança de teóricos progressistas em relação a uma
alternativa ao capitalismo global, e a crise de oportunidades para jovens em
países industrializados, prejudicados pela economia fraca.
Sonho renovado
Miyazaki é
um dos grandes estudiosos do tema. Em seu primeiro livro, The Method of Hope
(“O Método da Esperança”), de 2004, ele analisa como os suvavous, de Fiji, têm
mantido a esperança de recuperar sua terra ancestral, ocupada pela capital do
país, mesmo depois de cem anos de pedidos frustrados, por meio de estratégias
como doação de presentes, rituais cristãos e práticas de negócios. O segundo,
Arbitraging Japan (“Japão em Arbitragem”, em tradução livre), de 2013, trata
dos sonhos de futuro de corretores de bolsa japoneses em meio à prolongada
crise de crescimento do país.
Miyazaki foi um dos
membros do conselho consultivo de uma das maiores iniciativas acadêmicas para
estudar a esperança: a Hope & Optimism, um investimento de US$ 5 milhões
liderado pelo professor de filosofia Andrew Chignell (atualmente na Universidade
da Pensilvânia) que reuniu pesquisadores das universidades da Pensilvânia,
Cornell e Notre Dame (EUA) para explorar as dimensões teóricas, empíricas e
práticas da esperança, do otimismo e de estados relacionados a eles. Iniciados
em 2014, os estudos estão sendo concluídos este ano e deverão trazer um vasto
material novo para a ciência se aprofundar nesse terreno.
Enquanto
isso, vale a pena investir na esperança. Como lembra Barbara Fredrickson, “ao
contrário de qualquer outra criatura terrestre, nós, seres humanos, podemos
imaginar nosso próprio futuro e, ao fazê-lo, todas as calamidades possíveis.
Sem esperança, nossas previsões podem nos restringir ao desespero imobilizante.
No entanto, com a esperança, nos energizamos para fazer o máximo que pudermos a
fim de resolver nossos dilemas atuais e criar uma vida boa para nós mesmos e
para os outros”.
A vida melhor
A
esperança é um conceito comum a diversas religiões e já aparece na mais antiga
delas ainda viva, o hinduísmo. A esperança hinduísta está ligada à ideia de
carma, a lei de ação e reação. Uma jornada voltada para ações positivas, de
acordo com essa religião, resultará inevitavelmente em bem-aventurança e
elevação interior, nesta vida ou numa futura.
Guia para construir
esperança
A seguir, um roteiro
elaborado pelo psicólogo Anthony Scioli para que a esperança seja reerguida e
mantida.
1) Metas – Anote
seus três objetivos de vida mais importantes. Agora, liste três ou quatro
modelos inspiradores e gente que pode ajudar e lhe fornecer experiências de
capacitação.
2)Relacionamentos – Liste
de duas a três pessoas que irão construir, e não corroer, seu senso de
confiança. Procure gente com quem você pode se abrir e evite indivíduos que o
fazem se sentir cauteloso ou defensivo. Comprometa-se a conhecer ou se
encontrar com um desses indivíduos pelo menos uma vez por semana.
3) Estratégias de conduta – Liste
duas ou três habilidades de gerenciamento de estresse que você tem ou gostaria
de ter e comprometa-se a praticá-las pelo menos várias vezes por semana. A
esperança também está relacionada a ter opções. Qual é sua forma preferida de
lidar com os problemas? Resolvendo-os, evitando-os, buscando apoio de outros,
orando, planejando-se antecipadamente? Todas essas estratégias têm seu lugar. O
objetivo é expandir seu repertório de enfrentamento. Comprometa-se a praticar
uma ou duas estratégias que não fazem parte do seu repertório de enfrentamento
normal.
4) Espiritualidade – Liste
quatro ou cinco das suas maiores fontes de fé. Isso pode ser um deus ou poder
superior, amigos, instituições sociais, qualquer coisa que lhe pareça
espiritual. Faça um comitê para desenvolver um plano estratégico a fim de
aprimorar sua fé e sensação de espiritualidade nessas áreas.
5) Compromisso – Escreva
uma “declaração de missão” pessoal, elaborando-a o suficiente para orientar
seus pensamentos, sentimentos e comportamentos diários. Considere colocar essa
declaração em uma ou mais áreas visíveis ou em um local facilmente acessível,
ao qual você pode recorrer quando a vida fica agitada, confusa ou frustrante.
Benefícios da esperança
• Aumento
da autoestima
• Aumento da autoconfiança
• Aumento do bem-estar
• Aumento da criatividade
• Aumento da resiliência física e mental
• Estímulo à fraternidade e ao sentimento de grupo
• Estilo de vida mais sadio
• Maior longevidade
• Maior paz espiritual
• Maior rede de relacionamentos sociais
• Maior tolerância à dor
• Melhora na condição cardiovascular
• Redução da ansiedade e da depressão
• Redução do estresse
• Aumento do bem-estar
• Aumento da criatividade
• Aumento da resiliência física e mental
• Estímulo à fraternidade e ao sentimento de grupo
• Estilo de vida mais sadio
• Maior longevidade
• Maior paz espiritual
• Maior rede de relacionamentos sociais
• Maior tolerância à dor
• Melhora na condição cardiovascular
• Redução da ansiedade e da depressão
• Redução do estresse
Fonte: https://www.revistaplaneta.com.br/esperanca-o-impulso-para-melhorar/
Nenhum comentário:
Postar um comentário